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O preconceito nosso de cada dia




Silvana Mascagna
O preconceito nosso de cada dia


PUBLICADO EM 22/05/13 - 3h0
Não tinha me tocado disso até ouvir, da boca de uma amiga da minha irmã, que todos somos preconceituosos, em maior ou menor grau. O que faz a diferença é o exercício diário de combater todo e qualquer tipo de preconceito sobre o que quer que seja, assim que ele tenta se instalar, e jamais, em tempo algum, permitir que ele se manifeste.


Pode ser fácil, hoje em dia, para um determinado grupo de pessoas, levantar bandeira contra a opressão dos negros e não titubear um segundo sequer em exigir que sua faxineira negra suba pelo elevador social. Pode ser tranquilo para alguns fazer discursos inflamados sobre o quanto é legítimo um casal gay casar e adotar uma criança.


O difícil parece ser aceitar que o homossexual que quer os mesmos direitos dos heterossexuais seja seu filho ou mesmo que o negro se torne o seu genro.


Pode ser muito tranquilo ter amigo gay e se divertir com ele, mas espera só para ver quando a “bichinha” for promovida à vaga que você estava esperando. E o colega, “com aquele cabelo ruim que só fica mais ou menos bom alisado”, como ousam colocar num cargo de chefia?


As aspas, por incrível que pareça, caro leitor, se referem a discursos ouvidos por mim de colegas jornalistas, em situações parecidas com essas.


É preciso estar atento, alerta: o preconceito é traiçoeiro e está sempre pronto para se manifestar. Relaxa só para ver, e você já se vê falando: “Como pode alguém querer essa menina, gorda desse jeito!”; “Não acredito que aquele gatinho está namorando aquela velha”; “Só podia ser de Contagem mesmo”; “Tinha que ser mulher pra fazer uma cagada dessas”; “Feia desse jeito, coitada, nunca vai arrumar ninguém”; “Com essa minissaia, ela queria o quê?”...


Preconceitos há de todos os tipos. E fazer parte de um grupo que é discriminado não isenta ninguém de sair discriminando. Há as negras que fazem chacota de pessoas mais velhas; há as gordas que têm problemas com os homossexuais; os gays que têm ojeriza de gente pobre; judeu que não gosta de paulista. É, existe até quem odeie o outro só porque ele nasceu em determinado local. Imagina!


Nunca me esqueço de uma cena de “Promessas de um Novo Mundo”, documentário sobre crianças israelenses e palestinas. Num determinado momento, um garoto palestino, que tinha acabado de fazer um discurso inflamado contra Israel e os Estados Unidos, custa a acreditar ao descobrir que o diretor do filme, por quem já havia se afeiçoado, era norte-americano. O documentário, de B.Z. Goldberg, aliás, é uma ode ao não preconceito, primeiro, ao revelar o quanto são iguais as crianças que vivem de lados opostos na mesma Jerusalém, e, depois, ao promover um encontro entre algumas delas.


Às vezes, um filme como esse serve de arma contra essa luta diária contra nossos próprios preconceitos. Em outras, basta a entrevista de um ator negro, que relata o quanto era desagradável ouvir o som de portas de carro sendo trancadas toda vez que atravessava a rua, quando ainda era uma criança pobre e favelada. Mas, na maioria do tempo, o exercício é se colocar no lugar do outro. Funciona.